Coluna Literária 4ª Edição - Especial FLI-BH
Foto: Arte/FMCBH

Coluna Literária 4ª Edição - Especial FLI BH

Esta edição da Coluna Literária está com uma cara diferente. Festiva, celebra a 4ª edição do Festival Literário Internacional de Belo Horizonte – FLI BH, que acontece de 10 a 20 de agosto deste ano. Apresenta os perfis literários das duas curadoras do FLI BH 2021: Ana Elisa Ribeiro e Madu Costa, e do ilustrador Nelson Cruz, que assina a ilustração desta edição do festival. Duas autoras e um autor que em sua mineiridade mostram na literatura o jeito belo-horizontino de ser. É evidente a contribuição de Madu Costa, Ana Elisa Ribeiro e Nelson Cruz para a produção artístico-literária do país, especialmente a literatura para crianças e jovens. Sendo assim, nada mais justo que dedicar uma edição inteira da Coluna para essas três grandes potências da Palavra - seja ela escrita ou falada - e da imagem.

O Festival Literário Internacional de Belo Horizonte - FLI BH alcança em 2021 a marca da quarta edição, já cravando sua existência no cenário cultural da cidade, do estado e de todo o país. Sua primeira edição ocorreu em 2015, com o tema “Imagina o Mundo, Imagina a Cidade”. Em 2017, a segunda edição teve como foco a diversidade, com o tema “Vozes de Todos os Cantos”. Já a terceira edição, realizada em 2019, dedicou-se às diversas formas da literatura e assumiu o tema “Do Livro à Voz: Narrativas Vivas”. 

Este ano, com o tema “Virando a página: Livro e Leitura tecendo amanhãs", o FLI BH vem mais uma vez lançar um olhar diferenciado para a literatura e a forma com que nos relacionamos com ela. Desta maneira, a Coluna Literária deste mês pretende evidenciar o potente trabalho das curadoras e do ilustrador Nelson Cruz, que muito também contribui para um fazer artístico mais sensível, diverso e ético. Não podemos deixar de mencionar que a homenageada desta edição do festival é a importante editora e jornalista Maria Mazarello Rodrigues, mais conhecida como Mazza, cuja trajetória profissional será destacada ao longo do festival. Para conhecer um pouco mais de Ana Elisa, Madu, Nelson e Mazza baixe gratuitamente o livro História afetiva de leitores e bibliotecas em Belo Horizonte, Edição das Organizadoras, 2020, disponível em historiaafetivabh.blogspot.com/.

Daniela Figueiredo e Samuel Medina

 

Madu Costa: Senhora de muitos sentidosMadu Costa

No seio familiar era Carmita, Mimita, Tatá. Na escola, algumas a chamavam de Maria. Outras, de Do Carmo. Um dia, pensando sobre um nome para assinar seus livros, recebeu a sugestão de uma amiga. Assim nasceu o nome Madu Costa. O nome, porque a escritora nasceu junto com a menina, educada através dos sentidos pelo pai e pela mãe, sempre estimulada a observar o mundo com olhos perspicazes.  

Pedagoga de formação e tendo exercido uma longa carreira como professora, Madu Costa considera que toda pessoa tem uma história de seu nome e essa história deve ser guardada e compartilhada com carinho. É impossível dissociar a escritora da educadora, pois a educação sempre esteve presente na forma com que Madu Costa se relacionava com o mundo. Para ela, a palavra, antes de chegar à razão, se aloja na emoção. Desta maneira, essas emoções e esses sentidos formam um repertório fundamental para a sua escrita. Assim, essa mulher atenta ao seu entorno, curiosa e divertida, é uma pessoa continuamente disposta a se surpreender e aprender com o mundo. 

Desde criança, Madu Costa gosta de ouvir. Sua literatura e seu comportamento partem de um lugar da escuta. Como educadora, sempre buscou estar no lugar da criança e esse ideal a seguiu também na sua carreira de escritora, contadora de histórias de letra e de voz. Integrante do Coletivo Iabás, Madu levou sua incansável curiosidade e constante vontade de escutar a uma viagem pela África, para conhecer quem ela chama de Terra Mãe. Desse périplo, muitas sementes e frutos surgiram. E no relato de suas jornadas, Madu se apresenta também Contadora da Vida.

Os livros de Madu são muitos. Deles, destaco A Janta da Anta (Belo Horizonte: Ed. Imprensa Nacional, 2000), Meninas negras (Belo Horizonte: Mazza Edições, 2006), Koumba e o Tambor Diambê (Desenhos de Rubem Filho. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2006. 2. ed. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2009), A Caixa de surpresa (Belo Horizonte: Nandyala, 2009), Cadarços Desamarrados (Desenhos de Rubem Filho. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2009) e Lápis de cor ( Ilustrações de Josias Marinho. Belo Horizonte: Nandyala, 2012). Madu também é cordelista. Uma de suas obras é Zumbi dos Palmares em cordel (Desenhos de Josias Marinho. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2013).

Para conhecer mais sobre a escritora, acesse:

Perfil Literafro

Madu Costa - Lápis de cor

Samuel Medina
 

NELSON CRUZ: um escritor e ilustrador para “bater com a cabeça na borda dos limites”*

Nelson Cruz

Nelson Cruz – escritor, ilustrador e artista plástico –  é belo-horizontino, nascido em 1957, descobriu na infância o gosto pelo desenho e, desde então, segue construindo seu percurso artístico. É ganhador de vários prêmios literários do país, como “Jabuti”, Biblioteca Nacional, Academia Brasileira de Letras e Associação Paulista de Críticos de Arte. Foi também indicado ao prêmio Hans Christian Andersen de ilustração, considerado o mais importante da literatura infanto-juvenil no mundo. Em 2022, juntamente com Marina Colasanti, Nelson novamente concorre ao citado prêmio. Caras leitoras e caros leitores, aviso de antemão que as linhas a mim destinadas nesta edição da Coluna são poucas perto da grandiosa trajetória profissional desse querido escritor e ilustrador.

A produção literária de Nelson Cruz para crianças e jovens subverte temáticas tradicionalmente dedicadas a este público, tendência contemporânea mundial da literatura infantil e juvenil de qualidade. Aborda questões políticas como em “O dia em todos disseram não” (2009), editora Global, narrativa cuja população contesta os desígnios de um rei que deseja guerrear para expandir territórios. Em “O livro do acaso” (2014), editora Abacatte, as vozes de poetas e poetisas são reunidas para escrever a história de amor originária de um livro artesanal de madeirite criado pelo autor. Esta obra tornou-se a exposição que marca a 1ª edição do FLI BH, em 2015.

Com “Os herdeiros do lobo” (2009), editora Comboio de Corda, Nelson ganhou o 1º lugar do prêmio Jabuti na categoria infantil. “Os herdeiros do lobo” e “O livro do acaso” exemplificam a intertextualidade presente nas narrativas do escritor, assim como o trabalho de pesquisa envolvido na sua produção literária. A primeira dialoga com vários poemas da literatura brasileira e portuguesa. A segunda, além de ser referenciada pela tradição da narração de histórias, faz a interlocução com os contos de fada e as Artes Plásticas.

Nelson Cruz, além de escrever e ilustrar suas próprias obras, assina ilustrações de importantes livros da literatura infantil e juvenil, como “As margens da alegria” (2010), de João Guimarães Rosa, Nova Fronteira; e “O edifício” (2016), de Murilo Rubião, Positivo. Estes livros são exemplos de reedições de obras da literatura brasileira com projetos gráficos e editoriais pensados para crianças e jovens. Entre outros, têm ainda publicados como ilustrador “A menina na varanda” (2001), escrito por Leo Cunha, Record; “Rio acima, mar abaixo” (2005), texto de Rogério Andrade Barbosa, Melhoramentos; e “No olho da rua historinhas quase tristes” (2019), escrito por Georgina Martins, Ática. Convidamos todas e todos a conhecer, reconhecer e ressignificar a produção literária deste notável escritor e ilustrador das Gerais, porque, como cita Sara Bertrand, a literatura oferecida a crianças e jovens precisa fazer “bater com a cabeça na borda dos limites”. 

Daniela Figueiredo

* Frase de Georges Bataille, citada por Sara Bertrand no livro Patos e lobos marinhos: conversas sobre literatura e juventude (2021), Solisluna, Selo Emília.

 

Ana Elisa Ribeiro: a poeta multimodal

Ana Elisa RibeiroA literatura cerca Ana Elisa Ribeiro de muitas formas. Escritora e professora, tem sua formação em Letras e sempre se interessou no livro como suporte e nos processos que envolvem sua produção. Intimamente envolvida com a produção poética de BH, Ana Elisa passeia por diversos gêneros literários, entre a prosa e a poesia, bem como por diversas faixas etárias, entre crianças, adolescentes e adultos. Parte do corpo docente do curso de Letras - tecnologias de edição - no CEFET-MG, Ana Elisa tem um jeito arrojado e ligeiro de escrita. Entre seu livro de estreia, “Poesinha”, da coleção Poesia Orbital, no longínquo 1997, e “Doida pra escrever”, que será lançado agora pela editora Moinhos, Ana possui uma extensa lista de livros de poesia, contos, literatura para crianças e muitos (mas muitos, mesmo!) textos acadêmicos. 

Ana também é muito presente na internet onde mantém um diálogo contínuo com leitores, parceiros e alunos, seja através das redes sociais, dos textos escritos para portais literários ou de seu blog (endereço no fim do texto) que é um excelente diário/baú virtual de memórias. 

A autora teve obras indicadas a prêmios, como são os casos de “Anzol de Pescar Infernos”, que foi finalista do prêmio Portugal Telecom (atual Oceanos) em 2014, ou “Dicionário de Imprecisões”, que foi indicado ao Jabuti do ano passado. Além disso, ela foi responsável por editar, junto com o poeta Bruno Brum, três temporadas do projeto “Leve Um Livro”, que, através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura de Belo Horizonte, editou livretos de poetas da cidade e do Brasil todo, distribuídos gratuitamente em vários pontos da capital. Poetas de renome, como Ana Martins Marques, Fabrício Corsaletti, Glauco Mattoso e Amanda Bruno tiveram seus poemas circulando de forma gratuita em bibliotecas, centros culturais, bares e estações de metrô.

Meu livro favorito, dos muitos que ela publicou, é “Fresta por onde olhar”, lançado de maneira independente, em 2008. Como toda grande poeta, a linguagem da autora vai se transformando no tempo, mas esse livro carrega um condensado de suas melhores características literárias. Os versos sucintos que revelam um eu lírico irônico, sem medos ou pudores de abraçar o sarcasmo; um ar romântico que mescla desilusão e esperança; os ciúmes que revelam uma disposição à paixão. Os poemas carregam esse gosto de fruta, ao mesmo tempo doce e ácida. A identidade feminina, atravessada pelo enfrentamento ao machismo, pela afirmação de seu protagonismo num mundo ainda construído por e para homens, também aparece em muitos de seus poemas (nesse e em outros livros). Finalizando esse texto, penso que o melhor é inverter a frase de abertura e dizer: Ana Elisa Ribeiro cerca a literatura de muitas (e belas) formas.

                                        Rodrigo Teixeira

Para conhecer mais sobre a escritora, acesse:

Site da autora
Página no Facebook
Site com todo o acervo online da Coleção Leve o Livro

Texto da autora sobre “Fresta por onde olhar”, com link para baixar o PDF do livro.

*Fotos: Acervo pessoal