Fricções anacrônicas, ficções gráficas de Gustavo Machado - "marcas e texturas, grafias e textualidades do tempo"
Trazer até o rosto o papel e afundar o nariz na sua direção pra sentir com frescor o cheiro da tinta impressa ou tocar o papel com a palma das mãos e acarinhá-lo nas pontas dos dedos até provar entre elas a delicadeza das fibras são mímicas do desejo gráfico, ao qual pertencem também o encanto inaugural com a aparição da imagem, seu nascimento pelo contato das superfícies e seu sentido de revelação visual, para além, claro, do alcance ampliado de sua reprodutibilidade e difusão.
Tratamos aqui de uma libido gráfica, manifestada nas imagens da gravura. São mesmo sutis os afetos que se articulam ao longo dos processos de gravação e impressão, disseminados no enlace entre a gramatura do papel e a tênue camada de tinta que a recobre, a figurar a imagem – acontecimento repetível e partilhável, de leveza quase imaterial. “A xilogravura de J. Borges é tão bonita que dá vontade de comê-la”, foi o comentário de um cordelista nordestino que expressa bem esse aspecto sensual dos enredos e atributos da imagem gravada.